Ao criarmos uma Convocatória sobre Brincantes, nossa vontade era mesmo de entender o cotidiano desse agente da cultura popular. Queríamos ir até a sua casa, tomar um café, ver onde ele dorme, como ele guarda sua fantasia, como ele se prepara para os ensaios, como. Como é meio e caminho – um jeito andarilho de olhar.
Foi por isso que nos encantamos tanto com o ensaio de Hélia Scheppa, fotógrafa pernambucana conhecida pelas reportagens dos jornais locais. O ensaio “Seu Martelo” faz parte de uma reportagem junto ao jornalista Mateus Araujo para o Jornal do Comercio e conta a história de Sebastião, um dos mais antigos Mateus (palhaços) do Cavalo-marinho da Zona da Mata:
“…ele rompeu os limites do popular e também já adentrou na dança contemporânea. Durante oito anos, dividiu a cena com o Grupo Grial de Dança, em espetáculos como A barca e Castanho sua cor. Martelo cobra o título de Patrimônio Vivo de Pernambuco que nunca conseguiu receber do Governo do Estado e reclama que “é muito difícil ser Mateus, porque você não é valorizado”. No entanto, renova-se a cada dia, num espírito brincante e alegre, pronto para fazer do terreiro seu grande palco. É o brincante, na sua verdade e paixão, que faz do nosso Natal a festa de todas as gentes. Que faz da rua o grande palco do teatro popular”.
É com muito prazer que recebemos esse ensaio e convidamos Hélia para uma prosa:
De onde surgiu a fotografia na sua trajetória de vida?
A arte sempre esteve presente em minha vida. Desde pequena pintava com pastel e ali já percebia que a imagem era a maneira que escolhi para me comunicar. Fiz faculdade de jornalismo e a fotografia entrou em minha vida em 1997, quando decidi fazer curso na tradicional escola paulista Foto Cine Clube Bandeirante. Quando retornei ao Recife logo entrei em um jornal e, desde então, segui carreira no fotojornalismo. Após esse tempo, passando por 2 jornais aqui do Estado, no ano passado, 2015, decidi seguir independente.
Por que fotografar o cavalo-marinho em Pernambuco?
A ideia chegou após conversa com o colega de trabalho, o jornalista Mateus Araujo, sobre a vontade de documentar manifestações da cultura popular aqui em Pernambuco. Seu Martelo, o fotografado, é um dos mais antigos Mateus do cavalo-marinho pernambucano.
Quem é Mateus? Conte um pouco sobre esse brincante.
Mateus é um personagem icônico dos folguedos de cultura popular no Nordeste. É uma espécie de arlequim, da commedia dell’arte, que ganhou contornos brasileiros na zona da mata do pernambucana e paraibana. Mateus é um palhaço, que guia as apresentações de cavalo-marinho, uma expressão do folclore brasileiro. Ele usa uma roupa colorida e tem o rosto pintado de carvão. É um personagem vivido por cortadores de cana.
Para você, o que é “brincante”?
Brincante é o termo usado para se referir aos integrantes de folguedos e manifestações populares da cultura nordestina. São atores, músicos e bailarinos que lidam com a arte como uma “brincadeira”. Entre essas pessoas já se utilizam a expressão “brincar”, para se referir a participar da manifestação, por isso o termo “brincante”.
Fotos: Hélia Scheppa para JC, 2014. Ensaio recebido para Convocatória Brincante, em parceria com o Coletivo Nação e a Revista Raiz.