Andarilha é sobre caminhos e percursos. Por isso, abrimos um espaço para integrar todos aqueles que querem compartilhar suas andanças e processos criativos para fazer um filme, uma foto, um documentário, um livro, uma comida, uma música: arte.
Começamos o Diário de Bordo com um relato do fotógrafo Pio Figueiroa, que trouxe o seu estado de Pernambuco para São Paulo e a presença (de volta) à fotografia:
“No próximo dia 27 de maio, entra em cartaz a exposição Ver do Meio, um trabalho de Nelson Brissac, que provocou três fotógrafos a apreender uma cidade que “não se dar a ver”. Faço parte desse grupo ao lado de Arnaldo Pappalardo e Mauro Restiffe e a exibição acontecerá no Instituto Tomie Ohtake.
Relacionando uma percepção de São Paulo com um procedimento artístico, eu recomeço. Há pouco mais de uma década, constituí um coletivo, a Cia de Foto, que cumpriu sua trajetória e a concluiu em 2013, término que me devolveu algo irredutível: sou um fotógrafo criado na prática, na rua, na construção de cenas que obrigam presença. O modus operandi daquele tempo me afastou disso, pois lá os trabalhos surgiam numa dinâmica na qual se dava sentidos às imagens por construções posteriores. Agora, me volto às questões que aparecem na vivência do cotidiano da cidade em que moro, urgentes, e por isso mesmo suficientes como sintoma de um momento histórico que clama por retenções.
São Paulo com sua trama urbana que não garante precisões provoca-me retornar àquela fotografia que se faz na rua, tão imediata que mistura o fotógrafo ao assunto. Lentes curtas na escala de um caminhante faz aparecer fotografias no embate de corpo com a cidade. Apoio-me na capacidade da linguagem de prospectar solos trilhados e achar sobre eles inscrições de uma incompletude; de revelar histórias retidas e, de alguma forma, pressupostas nos rostos que vivem aqui: somos vencidos pelo movimento que nos leva à parte alguma senão ao espaço que nos sedimenta perdidos em São Paulo.
Uma percepção clara dessa cidade é que ela não se deixa ver. Seus traços urbanísticos bloqueados pela compactação de edifícios fazem com que percamos as referências geográficas mais comuns, como vales, montanhas, horizontes, ou mesmo o céu. Sobram multidões de rostos que quando se religam sugerem uma paisagem móvel. Pontos que remontam à trama de uma história que não admite vencedores. São Paulo tem uma cartografia de desencontros, aqui não há perspectiva, limite apenas. Estamos em um interior infinito, sempre de dentro.
Foi a unidade que se constrói a partir desses fragmentos cotidianos, os sentidos que se desenharam de uma imagem a outra, que me interessou investigar, nas fotografias suscitadas pela pesquisa que se deu exposição caminhando por São Paulo.”
Por Pio Figueiroa.
Fotos de Pio Figueiroa, Exposição Ver do Meio.
Exposição Arquitetura Brasileira – Ver do Meio. Abertura dia 27 de maio às 20h no Instituto Tomie Ohtake, São Paulo. Até 15 de julho de 2015 0 terça a domingo, das 11h às 20h.
4 Kommentare